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(1873-1957) é um teólogo sistemático reformado cujas obras têm sido muito influentes na teologia calvinista da América do Norte e da América Latina Sua Teologia Sistemática tem sido, durante décadas, o livro-texto utilizado em muitas faculdades protestantes de teologia no Brasil. Ele nasceu nos Países Baixos e mudou-se, ainda pequeno, para os Estados Unidos
A. Relação Entre a Palavra e os Sacramentos.
Em distinção da Igreja Católica Romana, as igrejas
da Reforma salientam a prioridade da Palavra de Deus. Enquanto aquela parte do
pressupostos de que os sacramentos contêm tudo que é necessário para a salvação
dos pecadores, não precisam de interpretação e, portanto, tornam a Palavra
completamente supérflua como meio de graça, estas consideram a Palavra como
absolutamente essencial, e apenas levantam a questão, por que se lhe deve
acrescentar os sacramentos. Alguns luteranos alegam que uma graça específica,
diferente da que é produzida pela Palavra é transmitida pelos sacramentos. Isso
é quase universalmente negado pelos reformados (calvinistas), uns poucos
teólogos escoceses e o doutor Kuyper formando exceções à regra. Eles assinalam
o fato de que Deus criou o homem de tal maneira, que ele obtém conhecimento
particularmente pelas avenidas dos sentidos da visão e da audição. A Palavra
está adaptada aos ouvidos e os sacramentos aos olhos. E, desde que os olhos são
mais sensíveis que os ouvidos, pode-se dizer que Deus, ao acrescentar os
sacramentos à Palavra, vem em auxílio do pecador. A verdade dirigida aos
ouvidos através da Palavra está representada simbolicamente nos sacramentos
para os olhos. Deve-se ter em mente, porém, que, enquanto a Palavra pode
existir e também é completa sem os sacramentos, os sacramentos nunca são
completos sem a Palavra. Há pontos de semelhança e de diferença entre a Palavra
e os sacramentos.
1. PONTOS DE SEMELHANÇA. Eles concordam: (a) no
autor, visto que Deus mesmo instituiu ambos como meio de graça; (b) no
conteúdo, pois Cristo é o conteúdo central tanto da Palavra como dos
sacramentos; e (c) na maneira pela qual o conteúdo é assimilado, isto é, pela
fé. Esta constitui o único modo pelo qual o pecador pode tornar-se participante
da graça oferecida na Palavra e nos sacramentos.
2. PONTOS DE DIFERENÇA. Eles diferem: (a) em sua
necessidade, sendo que a Palavra é indispensável, ao passo que os sacramentos
não; (b) em seu propósito, desde que a Palavra visa a gerar e a
fortalecer a fé, enquanto que os sacramentos servem somente para fortalecê-la;
e (c) em sua extensão, visto que a Palavra vai pelo mundo inteiro, ao passo que
os sacramentos só são ministrados aos que estão na igreja.
B. Origem e Sentido da Palavra Sacramento.
A palavra sacramento não se encontra na Escritura. É derivada do termo latino sacramentum ,
que originariamente denotava uma soma de dinheiro depositada por duas partes em
litígio. Após a decisão da corte, o dinheiro da parte vencedora era devolvido,
enquanto que a da perdedora era confiscada. Ao que parece, isto era chamado sacramentum
porque objetivava ser uma espécie de oferenda propiciatória aos deuses. A
transição para o uso cristão do termo deve ser procurada: (a) no uso militar do
termo, em que denotava o juramento pelo qual um soldado prometia solenemente
obediência ao seu comandante, visto que no batismo o cristão promete obediência
ao seu Senhor; e (b) no sentido especificamente religioso que o termo adquiriu
quando a Vulgata o empregou para traduzir o grego mysterion . É possível
que este vocábulo grego fosse aplicado aos sacramentos por terem eles uma tênue
semelhança com alguns dos mistérios das religiões gregas. Na Igreja Primitiva a
palavra saramento era empregada primeiramente para denotar todas as espécies de doutrinas e ordenanças. Por esta mesma razão, alguns se opuseram ao nome e
preferiam falar em sinais ou mistérios. Mesmo durante e imediatamente após a Reforma, muitos não gostavam do
nome sacramento. Melanchton empregava signi , e tanto Lutero como Calvino achavam necessário
chamar a atenção para o fato de que a palavra sacramento não é
empregada em seu sentido original na teologia. Mas o fato de que a palavra não
se encontra na Escritura e de que não é utilizada em seu sentido original
quando aplicada às ordenanças instituídas por Jesus, não tem por
que dissuadir-nos, pois muitas vezes o uso determina o sentido de uma palavra.
Pode-se dar a seguinte definição de sacramento: Sacramento é uma santa
ordenança instituída por Cristo, na qual, mediante sinais perceptíveis, a graça
de Deus em Cristo e os benefícios da aliança da graça são representados,
selados e aplicados aos crentes, e estes, por sua vez, expressam sua fé e sua
fidelidade a Deus.
C. Partes Componentes do Sacramento.
Devemos distinguir três partes nos sacramentos.
1. O SINAL EXTERNO OU VISÍVEL. Cada sacramento
contém um elemento material, palpável aos sentidos. Num sentido bem livre, este
elemento às vezes é chamado sacramento. Contudo, no sentido estrito da palavra,
o termo é mais inclusivo e denota o sinal e aquilo que é significado ou
simbolizado. Para evitar mal-entendido, deve-se ter em mente este uso
diferente. Isto explica por que se pode dizer que um descrente pode receber, e,
todavia, não receber o sacramento. Não o recebe no sentido pelo da palavra. O
objeto externo do sacramento inclui, não somente os elementos que se usam, a
saber, água, pão e vinho, mas também o rito sagrado, aquilo que se faz com
estes elementos. Segundo este ponto de vista externo, a Bíblia denomina os
sacramentos sinais e selos, Gn 9.12, 13; 17.11; Rm 4.11.
2. A GRAÇA ESPIRITUAL INTERNA, SIGNIFICADA E
SELADA. Os sinais e selos pressupõem algo que é significado e selado e que
geralmente é chamado matéria interna do sacramento. Esta é variadamente
indicada na Escritura como aliança da graça, Gn 9.12, 13; 17.11, justiça da fé,
Rm 4.11, perdão dos pecados, Mc 1.4: Mt 26.28, fé e conversão, Mc 1.4; 16.16,
comunhão com Cristo em Sua morte e ressurreição, Rm 6.3, e assim por diante.
Declarada resumidamente, pode-se dizer que consiste de Cristo e todas as Suas
riquezas espirituais. Os católicos romanos a vêem na graça santificante
acrescentada à natureza humana, capacitando o homem a praticar boas obras e a
subir às alturas da visio Dei (visão de Deus). Os sacramentos não
significam meramente uma verdade geral, mas uma promessa dada a nós e por nós
aceita, e servem para fortalecer a nossa fé com respeito à realização dessa
promessa, Gn 17.1-14; Ex 12.13; Rm 4.11-13. eles representam visivelmente e
aprofundam a nossa consciência das bênçãos espirituais da aliança, da
purificação dos nossos pecados e da nossa participação na vida que há em
Cristo, Mt 13.11; Mc 1.4, 5; 1 Co 10.2, 3, 16, 17; Rm 2.28, 29; 6.3, 4; Gl
3.27. como sinais e selos, eles são meios de graça, isto é, meios pelos quais
se fortalece a graça interna produzida no coração pelo Espírito Santo.
3. UNIÃO SACRAMENTAL ENTRE O SINAL E QUILO QUE É
SIGNIFICADO. Geralmente se lhe chama forma sacramenti , forma dos
sacramentos ( forma significando aqui essência), porque é exatamente a
relação entre o sinal e a coisa significada que constitui a essência do
sacramento. Segundo o conceito reformado (calvinista), esta (a) não é física
, como pretendem os católicos romanos, como se a coisa significada fosse
inerente ao sinal e o recebimento da matéria externa incluísse
necessariamente a participação na matéria interna ; (b) nem local, como
a descrevem os luteranos, como se o sinal e a coisa significada estivessem
presentes no mesmo espaço, de sorte que tanto os crentes como os incrédulos
recebessem o sacramento completo ao receberem o sinal; (c) mas espiritual ,
ou como o expressa Turretino, moral e relativa , de modo que, quando o
sacramento é recebido com fé, a graça de Deus o acompanha. Conforme este
conceito, o sinal externo torna-se um meio empregado pelo Espírito Santo na
comunicação da graça divina. A estreita relação existente entre o sinal e a
coisa significada explica o emprego daquilo que geralmente se chama linguagem
sacramental, na qual o sinal é mencionado em lugar da coisa
significada, ou vice-versa , Gn 17.10; At 22.16; 1 Co 5.7.
D. Necessidade dos Sacramentos.
Os católicos romanos afirmam que o batismo é
absolutamente necessário para todos, para a salvação, e que o sacramento da
penitência é igualmente necessário para aqueles que cometeram pecado mortal
depois do batismo; mas que a confirmação, a eucaristia e a extrema unção são
necessárias somente no sentido de que foram ordenadas e são eminentemente
úteis. Por outro lado, os protestantes ensinam que os sacramentos não são
absolutamente necessários para a salvação, mas são obrigatórios em vista do
preceito divino. A negligência voluntária do seu uso redunda no empobrecimento
espiritual e tem tendência destrutiva, precisamente como acontece com toda
desobediência persistente a Deus. Que não são absolutamente necessários para a
salvação, segue-se: (1) do caráter espiritual e livre da dispensação do
Evangelho, na qual Deus não prende a Sua graça ao uso de certas formas
externas, Jo 4.21, 23; Lc 18.14; (2) do fato de que a Escritura menciona
unicamente a fé como condição instrumental da salvação, Jo 5.24; 6.29; 3.36; At
16.31; (3) do fato de que os sacramentos não originam a fé, mas a pressupõem, e
são ministrados onde se supõe a existência da fé, At 2.41; 16.14, 15, 30, 33; 1
Co 11.23-32; e (4) do fato de que muitos foram realmente salvos sem o uso dos
sacramentos. Pensemos nos crentes anteriores ao tempo de Abraão e no ladrão
penitente na cruz.
E. Os Sacramentos do Velho e do Novo Testamentos Comparados.
1. SUA UNIDADE ESSENCIAL. Roma alega que há
diferença essencial entre os sacramentos do Velho Testamento e os do
Novo. Ela afirma que, à semelhança de todo o ritual da antiga aliança, seus
sacramentos também eram meramente típicos. A santificação produzida por eles
não era interna, mas apenas legal, e prefigurava a graça que haveria de ser
conferida ao homem no futuro, em virtude da paixão de Cristo. Isso não
significa que nenhuma graça interna acompanhava o uso deles, mas simplesmente
que isso não era efetuado pelo sacramento propriamente ditos, como acontece na
nova dispensação. Eles não tinham eficácia objetiva, não santificavam o
participante ex opere operato , mas unicamente ex opere operantis ,
isto é, por causa da fé e caridade com que eram recebidos. Uma vez que a plena
concretização da graça tipificada por aqueles sacramentos dependia da vinda de
Cristo, os santos do Velho Testamento foram encerrados no Limbus Patrum (Limbo
dos Pais) até Cristo os tirar de lá. A verdade, porém, é que não há diferença
entre os sacramentos do Velho Testamento e os do Novo. Provam-no as seguintes
considerações; (a) em 1 Co 10.1-4 Paulo atribui à igreja do Velho Testamento
aquilo que é essencial nos sacramentos do Novo testamento; (b) em Rm 4.11 ele
fala da circuncisão de Abraão como selo da justiça da fé; e (c) em vista do
fato de que eles representam as mesmas realidades espirituais, os nomes dos
sacramentos de ambas as dispensações são utilizados uns pelos outros: a
circuncisão e a páscoa são atribuídas à igreja do Novo Testamento, 1 Co 5.7; Cl
2.11, e o batismo e a Ceia do Senhor à igreja do Velho Testamento, 1 Co 10.1-4.
2. SUAS DIFERENÇAS FORMAIS. Não obstante a unidade
essencial dos sacramentos das duas dispensações, há certos pontos de diferença.
(a) Em Israel os sacramentos tinham um aspecto nacional em acréscimo à sua
significação espiritual como sinais e selos da aliança grega. (b) Ao lado dos
sacramentos, Israel tinha muitos outros ritos simbólicos, tais como as ofertas
e as purificações, que no essencial concordavam com os seus sacramentos, ao
passo que os sacramentos do Novo Testamento estão absolutamente sós. (c) Os
sacramentos do Velho Testamento apontavam para Cristo no futuro, e eram os
selos da graça que ainda teriam que ser merecidas, ao passo que os do Novo
testamento apontam para Cristo no passado e o Seu sacrifício de redenção já
consumado. (d) Em harmonia com o conteúdo total da dispensação do Velho
Testamento, a porção da graça divina que acompanhava o uso dos sacramentos do
Velho Testamento era menor do que a que atualmente se obtém mediante o
confiante recebimento dos sacramentos do Novo Testamento.
F. Número dos Sacramentos.
1. NO VELHO TESTAMENTO. Durante a antiga
dispensação havia dois sacramentos, quais sejam, a circuncisão e a páscoa.
Alguns teólogos reformados (calvinistas) eram de opinião que a circuncisão
originou-se em Israel e foi auferido deste povo da aliança por outras nações.
Mas agora é patentemente claro que esta posição é insustentável. Desde os
tempos mais primitivos, os sacerdotes egípcios eram circuncidados. Além disso,
a prática da circuncisão se acha em muitos povos da Ásia, da África e até da
Austrália, e é muito improvável que todos a tenham derivado de Israel. Todavia,
somente em Israel ela se tornou um sacramento da aliança da graça. Como
pertencente à dispensação do Velho Testamento, era um sacrifício cruento,
simbolizando a excisão da culpa e da corrupção do pecado, e constrangendo as
pessoas a deixarem que o princípio da graça de Deus penetrasse suas vidas
completamente. A páscoa também era um sacrifício cruento. Os israelitas
escaparam do destino dos egípcios com sua substituição por um sacrifício, que
foi um tipo de Cristo, Jo 1.29, 36; 1 Co 5.7. A família salva comeu o cordeiro
que fora imolado, simbolizando assim um ato assimilativo de fé, muito parecido
com o ato de comer o pão na Ceia do Senhor.
2. NO NOVO TESTAMENTO. A igreja do Novo Testamento
também tem dois sacramentos a saber, o batismo e a Ceia do Senhor. Em harmonia
com a nova dispensação em seu conjunto global, eles são sacramentos incruentos.
Contudo, simbolizam as mesmas bênçãos espirituais que eram simbolizadas pela
circuncisão e pela páscoa na antiga dispensação. A igreja de Roma aumentou para
sete o número dos sacramentos de maneira totalmente infundada. Aos dois que
foram instituídos por Cristo ela acrescentou a confirmação, a penitência, a
ordenação, o matrimônio e a extrema unção. Ela procura base bíblica para a
confirmação em At 8.17; 14.22; 19.6; Hb 6.2; para a penitência em Tg 5.16; para
a ordenação em 1 Tm 4.14; 2 Tm 1.6; para o matrimônio em Ef 5.32; e para a
extrema unção em Mc 6.13; Tg 5.14. Pressupõe-se que cada um destes sacramentos
comunica, em acréscimo à graça geral da santificação, uma graça sacramental
especial, diferente em cada sacramento. Esta multiplicação dos sacramentos
criou uma dificuldade para a igreja de Roma. Geralmente se admite que, para
serem válidos, precisam ter sido instituídos por Cristo; mas Cristo instituiu
apenas dois. Conseqüentemente, ou os outros não são sacramentos, ou o direito
de instituí-los terá que ser atribuído aos apóstolos também. Na verdade, antes
do Concílio de Trento, muitos asseveravam que os cinco adicionais não foram instituídos
diretamente por Cristo, mas por meio dos apóstolos. Todavia, aquele concílio
declarou ousadamente que todos os sete sacramentos foram instituídos
pessoalmente por Cristo, e, desse modo, impôs à teologia da sua igreja uma
tarefa impossível. É um ponto que tem que ser aceito pelos católicos romanos
com base no testemunho da igreja, mas que não de vê ser comprovado.
Fonte: BERKHOF,
Louis. Teologia Sistemática. Editora Cultura Cristã.
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